Freitag, April 16, 2010

Some e substraia que funciona.

Voltando a movimentar isso que há muito estava às moscas. Meu ultimo post foi em Setembro de 2007, há mais de 2,5 anos. Muita coisa aconteceu nesse tempo e quase tudo que eu escrevi é impublicável. Para variar um pouco, comecei a escrever muita coisa para postar aqui, mas sempre ficou inacabado. Esse é o primeiro que sobreviveu desde então e ainda demorei algumas semanas para terminá-lo. Não sei se continuarei postando. Gostaria muito de fazê-lo, mas já tem um tempo que ando reticente e isso não ajuda. Aí vai:

"Arquimedes será lembrado quando Ésquilo tiver sido esquecido, porque as línguas morrem, mas as ideias matemáticas não. 'Imortalidade' talvez seja uma palavra tola, mas ao matemático, provavelmente, é dada a MELHOR oportunidade de descobrir seu significado." - G.H. Hardy.


Li o livro Tio Petros e a conjectura de Goldbach, de Apostolos Doxiadis e a conclusão é: Deveria ter lido esse livro antes.
O livro conta um pouco da história de Petros Papachristos, um matemático Grego que torrou sua vida tentando resolver a conjectura de Goldbach (depois eu falo dela). A história é contada pelo sobrinho de Petros, Apostolos, daí o nome "Tio Petros...". A história desse cara tem uma grande relevância especialmente para quem quer se meter com matemática. Também serve para quem quer se meter com ciência em geral (ciência de verdade).
Mas qual é essa relevância? Porque desde crianças até mesmo na universidade, nos contam a história de grandes pessoas de sucesso: Euler fez isso, Arquimedes aquilo, Einstein descobriu isso, Newton era fodão, Darwin sei lá o que... Quando nos apresentam a ciência, a pesquisa, quando nos contam sua história, sempre aparece só o que deu certo e quem deu certo. E quando o cara que escuta é meio fascinado por ciência (tipo eu), a história desses caras é encantadora, é inspiradora, desperta aquele "porra, quero fazer um bagulho assim também".
Só que tem coisas que NUNCA são contadas. Histórias de caras super fracassados, por exemplo. Nunca aparece a história como a do Petros. Nunca contam que para cada cientista de sucesso há uma leva (bem gorda) de caras mais-ou-menos e outro tanto de caras que dão muito errado! Parece que é só estudar muito e pronto.
Atenção você que está todo empolgadinho querendo fazer matemática: você NÃO É o novo Gauss. A pesquisa de ponta em matemática é uma coisa extremamente distante. O que tinha de fácil para pesquisar em matemática acabou há uns 4000 anos. O que tinha de difícil para fazer em matemática acabou tem uns... 200 anos. Só sobrou a mega-pica-plus e tá ficando cada vez mais difícil. Nos últimos 50 anos, o cara gasta boa parte da vida (uns 10 anos entre graduação, mestrado e doutorado) só para começar a entender mais ou menos o que já existe e aí ter uma ideia do que vai pesquisar. É claro que eu não sou ninguém para dizer que você não vai dar em nada. O que eu quero dizer é que a chance de você não dar em nada é altíssima! Porque os caras que são MUITO BONS acabam na pesquisa medíocre, o que eu chamo de "carboidrato da ciência", que é um tipo de pesquisa ESSENCIAL, mas EXTREMAMENTE difícil e não fará você ser lembrado como o Newton.

"A solidão do pesquisador que trabalha com matemática original é diferente de qualquer outra. No verdadeiro sentido da palavra, ele habita um universo que é inacessível, tanto ao grande público quanto a seu ambiente imediato. Mesmo os que lhe estão próximos não podem compartilhar de suas alegrias e tristezas, já que não são capazes de compreender o significado delas." - trecho do livro.

E o livro traz o exemplo de outra coisa: não adianta se matar de estudar, abrir mão da própria vida em razão disso. Petros recusou muita coisa interessante porque "tinha que trabalhar full time" na conjectura. Não adiantou e ele se frustrou profundamente. Morreu sozinho e meio louco. Não reconheceu o fracasso e dizia que não conseguiu por azar... AZAR?!? E esse não é o único exemplo. A matemática é uma ciência que tem uma concentração altíssima de profissionais frustrados. E por quê? Simplesmente porque a formação e o trabalho do pesquisador em matemática são MUITO mais difíceis do que o seu, seja lá quem for você não-matemático (foda-se se você discorda. A coisa é assim.), e não traz reconhecimento de ninguém, nem da sua própria família muito menos da sociedade. Ninguém respeita matemáticos, a maioria das pessoas "detesta matemática" e jogam a culpa pela própria incapacidade no matemático. E também não traz aquela satisfação financeira. Médicos descontam as dificuldades de sua formação extorquindo pacientes: "-Sua saúde ou seu dinheiro, com qual você quer ficar?" e assim eles enriquecem. Na matemática não dá para fazer isso.

Eu sempre disse que absolutamente NADA no mundo é fácil, rápido e barato. Na matemática a coisa é muito pior. Então pense muito bem antes de se meter nisso. Não estou falando para você desistir. A matemática é linda, fantástica, encantadora. Mas você precisa mais do que vontade para ser matemático e precisa mais do que matemática para viver.


Um pouco sobre a conjectura de Goldbach

O que vem a seguir é um extrato da wikipédia.

Uma conjectura é uma ideia, fórmula ou frase, a qual não foi provada ser verdadeira, baseada em suposições ou ideias com fundamento não verificado. A conjectura de Goldbach é um problema não resolvido da teoria dos números. Ela diz que todo número par maior que 2 pode ser escrito como a soma de dois números primos. Por exemplo: 4 = 2 + 2; 6 = 3 + 3; 8 = 5 + 3; 10 = 3 + 7 = 5 + 5; 12 = 5 + 7; etc.
Parece simples, mas nunca ninguém conseguiu provar isso. O melhor resultado teórico até agora foi dado por Olivier Ramaré em 1995: todo número par é a soma de até 6 números primos. Para valores pequenos, a conjectura de Goldbach pode ser testada diretamente ou usando computadores (método conhecido jocosamente pelos matemáticos como força bruta e ignorância). Na base da força bruta, já se sabe que o resultado vale para números pares até 1,609*1018, ou seja, até 1.609.000.000.000.000.000, o que em matemática se considera um "número pequeno", já que o que interessa mesmo é provar para TODOS os pares. O que é 1.609*1018 perto de todos os números?

Para promover o livro, a editora inglesa desse livro, a Tony Faber, ofereceu o prêmio de $1.000.000 para quem apresentasse uma prova da conjectura até abril de 2002. Ninguém reclamou o prêmio.